DW África: Julgamento de Kalupeteka arranca a 18 de janeiro

DW África: Julgamento de Kalupeteka arranca a 18 de janeiro

Data foi confirmada pelo advogado David Mendes, em entrevista à DW África. Defesa diz estar preocupada com a segurança dos advogados e volta a denunciar dificuldades na recolha de provas.

O julgamento do líder da Igreja Adventista do Sétimo Dia a Luz do Mundo, José Julino Kalupeteka, e de dez fiéis da seita, tem início a 18 de janeiro, no Tribunal Provincial do Huambo, em Angola. A data foi confirmada à DW África por David Mendes, um dos advogados de defesa de Kalupeteka.

Na origem do caso estão confrontos no monte Sumi, município da Caála, em Abril de 2015, que levaram à morte, segundo a versão oficial, de nove polícias e 13 fiéis. Relatos não oficiais dão conta de centenas de vítimas mortais.

O líder da seita religiosa e os seus seguidores foram indiciados de crime de homicídio qualificado consumado e homicídio qualificado frustrado, desobediência, resistência e posse ilegal de arma de fogo. Em entrevista à DW África, David Mendes diz que a defesa teme pela segurança dos advogados envolvidos no processo. O ativista da Associação Mãos Livres critica ainda os obstáculos impostos à defesa na recolha de provas.

DW África: Os advogados apelaram à reconstituição do crime no local, o monte Sumi, no Huambo, mas houve vários impedimentos. Desde então, conseguiram recolher todos os elementos necessários para a contra-argumentação?

David Mendes (DM): Não, até ao momento não fomos até ao local.Até ao momento não temos contacto com aquilo que, para nós, seriam os elementos de prova. Durante a primeira audiência, vamos insistir na necessidade de reconstrução do crime e da ida ao terreno, porque não podemos aceitar que o Ministério Público, isto é, a acusação, teve acesso ao espaço, a todos os meios disponíveis de provas e a defesa não. Isto torna a defesa desequilibrada. Se o Ministério Público tem acesso ao local do crime, a defesa também deveria ter tido. Isto não aconteceu.

DW África: Dadas estas dificuldades, como é que a defesa se tem preparado para este caso?

DM: Vamos manter a nossa posição de querer ir ao terreno, não vamos abrir mão disso. Se o tribunal não aceitar que tenhamos acesso ao local, vamos encontrar alternativas, do ponto de vista da descoberta da verdade.

DW África: Prevê-se que este seja um caso muito mediático. A defesa pensa insistir junto das autoridades para garantir a presença dos jornalistas e do corpo diplomático, tal como aconteceu no julgamento dos ativistas angolanos em Luanda?

DM: Nos termos da lei angolana, os julgamentos devem ser abertos ao público. Em Luanda, lamentavelmente, impediu-se o acesso das pessoas ao tribunal. O único observador que está lá a assistir é a Associação Mãos Livres, no caso dos 15+2, porque há advogados que estão ligados à Associação que entram como advogados e não como membros da organização por si só. No caso Kalupeteka, temos informações complementares de excesso de segurança. Houve um dia em que se tentou fazer um contraditório e o índice de segurança colocado no local foi um absurdo. Pode limitar o acesso ao julgamento.

Por outro lado, temos estado a dizer que estamos preocupados com a segurança dos próprios advogados. Têm-nos chegado informações de que há pessoas que foram instruídas para molestarem os advogados. Queremos que o Governo provincial e o Ministério Público, como representante do Estado, garantam que os advogados não serão molestados durante esta fase do julgamento.

DW África: Detido desde 16 de junho, no Huambo, como está atualmente Kalupeteka?

DM: Do ponto de vista físico, encontra-se bem. Do ponto de vista emocional, está muito indignado. Ao que sabemos, para além do crime de homicídio no monte Sumi, Kalupeteka é alvo de mais uma acusação de um homicídio frustrado no Bié, onde se diz que, num dos centros de oração, também houve confrontos entre agentes da polícia e a população. O Tribunal do Bié mandou para o Tribunal do Huambo a competência para julgar também este caso. Este último processo não tem pernas para andar, segundo as nossas observações. Estamos preocupados, de facto, com o julgamento. Deve ser sério e não meramente formal. Já discutimos isto com o Kalupeteka e outros dois indivíduos que também serão julgados, tendo em conta que os depoimentos que fizeram foram obtidos mediante coação física. Foram torturados antes de serem ouvidos. Estamos a transmitir-lhes esta disposição psicológica, para que vão a julgamento sem medo e para que possam defender-se e exigir que quem os acusa apresente provas.

Exemplo de manipulação do sistema judicial

DW África: Julgamento de Kalupeteka arranca a 18 de janeiro

David Mendes, advogado de José Julino Kalupteka, detido desde 16 de junho, acusa o juiz de pressionar o líder da seita religiosa “A luz do mundo” a trocar de advogado e fala em politização do sistema judicial angolano.

A separação de poderes consagrada na Constituição da República de Angola de 2010 tem sido insistentemente questionada por operadores de direito e cidadãos que acompanham a evolução do sistema judicial angolano.

Juristas dizem que, do ponto de vista material, tem havido uma clara interferência do titular do poder executivo, o Presidente José Eduardo dos Santos, nas decisões tomadas pelos magistrados judiciais e do Ministério Público.

Exemplo disso é o caso Kalupeteka, afirma David Mendes, um dos advogados de defesa do líder da seita religiosa “A luz do mundo”.

David Mendes não entende posição do Tribunal do Huambo

O chamado “advogado dos pobres” diz que não entende a atitude do Tribunal Provincial do Huambo e do Ministério Público que os proibiu de reconstituir os factos no Monte Sumi, onde ocorreram os confrontos entre fiéis da seita e a polícia.

“O caso Kalupeteka é mais um exemplo de manipulação do sistema judicial. Todos nós esperávamos que se fizesse a reconstituição do crime, quando se esperava isso, o juíz preferiu não fazer a reconstituição do crime dizendo que confia na polícia. Se polícia é parte como é que o juíz vai aceitar o que diz a polícia? Que aberração houve neste processo! A título de exemplo, houve três horas de fogo e a polícia vem dizer que as duas armas apreendidas não dispararam”.

José Julino Kalupteka, detido desde 16 de junho, é acusado de homicídio qualificado. Segundo as autoridades, no Sumi morreram 13 civis e 9 agentes da Polícia Nacional. Já a UNITA fala em centenas de mortes.

As Nações Unidas solicitaram um inquérito independente, entretanto recusado pelo Governo de Luanda. Segundo David Mendes, Kalupeteka encontrava-se algemado no momento dos confrontos. E, por isso, não pode ter provocado a morte a alguém.

Estado de direito posto em causa

O jurista diz ainda que o Estado de direito está a ser posto em causa, já que não se está a fundamentar na separação de poderes.

“O mesmo acontece com Kalupeteka. Quando é que uma pessoa algemada mata alguém? Há coisas que nos levam afirmar que o regime está a politizar o sistema judiciário. O político está ta omar conta do judiciário e é muito grave quando o sistema judicial começa a ser manipulado. Não há Estado de direito”. David Mendes denuncia ainda que o juíz do Tribunal Provincial do Huambo está a pressionar Kalupeteka a mudar de advogado.

Entretanto, o julgamento do líder religioso e outros fiéis da seita “A Luz do Mundo” continua sem data prevista, segundo o advogado.

“O mais grave que merece denúncia pública é que o juíz pressionou Kalupeteka para mudar de advogado, isto é muito grave. Tendo em conta o nosso posicionamento de não alinharmos em atos de faz de conta, o juíz pressionou-o a mudar de advogado e ele recusou”.

A DW África tentou contactar o juiz presidente do Tribunal Provincial do Huambo, mas sem sucesso.

Fontes:

http://www.dw.com/pt/julgamento-de-kalupeteka-arranca-a-18-de-janeiro/a-18963501

http://www.dw.com/pt/caso-kalupeteka-%C3%A9-mais-um-exemplo-de-manipula%C3%A7%C3%A3o-do-sistema-judicial/a-18823945

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