Huambo: Sentença do caso do Irmão Kalupeteka foi remarcada para dia 5

Huambo – O Tribunal Provincial do Huambo remarcou para o próximo dia 5 de Abril a sessão de leitura da sentença do julgamento do caso Kalupeteka, em que são co-arguidos o líder da extinta seita religiosa Luz do Mundo, José Julino Kalupeteka, e nove seguidores seus.

A remarcação deve-se a factores técnicos, segundo o porta-voz da sessão de julgamento, Crescenciano Sapi, que deu a conhecer o facto à imprensa, nesta terça-feira.

A fonte não entrou em mais detalhes sobre os motivos.

 Huambo: Sentença do caso do Irmão Kalupeteka foi remarcada para dia 5Os 10 cidadãos arrolados neste caso começaram a ser julgados dia 18 de Janeiro, na 1ª sessão da sala dos crimes comuns, sob presidência do juiz da causa Afonso Pinto.

São acusados de assassinar nove polícias, em Abril de 2015, no município da Caála, província do Huambo.

A leitura da sentença colocará fim ao processo querela 141/2015, em que são arroladas provas do crime ocorrido na aldeia Caluei, município de Cunhinga, província do Bié, e no Monte Sumi, município da Caála, província do Huambo.

A última sessão de julgamento aconteceu no passado dia 7, tendo sido marcada pela leitura dos 327 quesitos.

Nesta sessão, o juiz questionou, entre outros, o envolvimento dos 10 co-réus nos crimes de homicídio qualificado, sob forma frustrada, homicídios qualificado, sob forma consumada, crime de desobediência, de danos materiais, resistências e posse ilegal de arma de fogo, a que são acusados pelo Ministério Público.

Também foram feitas perguntas relacionadas às declarações proferidas pelos co-arguidos e os declarantes arrolados no mesmo processo, durante os autos de instrução preparatória, de julgamento e da inspecção judicial, aquando da produção da prova material do crime, sobretudo o ocorrido no Monte Sumi, a 49 quilómetros da cidade do Huambo, onde foram assassinados os nove polícias.

José Julino Kalupeteka, líder da extinta seita religiosa Luz do Mundo, é o principal arguido do processo, que inclui os nacionais Filipe Quintas, Hossi Lucacuty Vilinga, João Zacarias, Agostinho Cangungo, Cipriano Colembe, Gabriel Esperança, Carlos Cussucala, Amós Cangumbe e Inocência Nunda.

Alegações do Ministério Público e da Defesa

A defesa insiste que, ao fim de praticamente três semanas de julgamento, não ficou provado que o líder da seita terá desobedecido, resistido às autoridades ou orientado os seus seguidores a criarem postos de vigilância para, posteriormente, agredirem os agentes da Polícia Nacional.

Já o Ministério Público concluiu, nas alegações finais, que os actos preparatórios alegadamente verificados antes do crime, a 16 de Abril – confrontos que levaram à morte, segundo a versão oficial, de nove polícias e 13 fiéis, no Huambo -, os elementos daquela igreja prepararam machados, facas, mocas para atacar os “inimigos da seita ou mundanos”.

A polícia e investigadores chamados a declarar garantiram em tribunal que, além do ataque atribuído aos seguidores, havia um plano de defesa armado organizado pelos fiéis no acampamento em causa.

Em causa estão os confrontos entre os fiéis e a polícia, cujos agentes tentavam dar cumprimento a um mandado de captura – na sequência de outro caso de violência na província vizinha do Bié e que também está a ser julgado – de Kalupeteka e outros dirigentes e alguns dos seguidores que estavam concentrados no acampamento daquela igreja, no monte Sumi, província do Huambo.

A defesa alegou anteriormente que na zona dos confrontos estariam cerca de oito dezenas de adultos, crianças e bebés, tendo a polícia apresentado em tribunal mais de 80 armas, como mocas e machados, apreendidos no local, suspeitando por isso da veracidade destas provas.

A acusação deduzida pelo Ministério Público do Huambo contra os homens, com idades entre os 18 e os 54 anos, refere que as mortes dos agentes da polícia resultaram essencialmente de agressões com objectos contundentes, inclusive paus, punhais e catanas, às quais alguns polícias responderam com disparos.

Quanto às centenas de vítimas mortais causadas pelas forças de segurança… nada.

Recorde-se que a oposição (política e social) angolana denunciou na altura dos crimes a existência de centenas de mortos entre os populares, naquele acampamento, e pediu uma investigação internacional, acusações e pretensão negadas pelo Governo.

Uma história à moda do regime

Quem esperava que o julgamento permitiria, mesmo que de forma ténue, esclarecer os acontecimentos de Abril de 2015, viu esse desejo frustrado.

Recorde-se que, em comunicado de imprensa, a organização não-governamental britânica Human Rights Watch (HRW), sob o título “Houve um massacre no Huambo, Angola?” considerava que o julgamento “pode, finalmente, lançar luz sobre os eventos”.

Aquela organização de defesa dos direitos humanos salientava ser “evidente que a morte indiscutível de nove agentes da polícia requer justiça e que as autoridades devem certificar-se de que o tribunal é capaz de conduzir o julgamento de forma independente, imparcial e competente”.

A HRW defende ainda que as testemunhas do governo no julgamento “também devem ser transparentes quanto à conduta da polícia e dar resposta às acusações de que dezenas de pessoas desarmadas, incluindo mulheres e crianças, podem ter sido assassinadas a tiro”.

“O conflito eclodiu quando a polícia procurou levar Kalupeteka para interrogatório com base em alegações de incentivo à desobediência civil de cerca de 2.000 dos seus fiéis. Kalupeteka liderava uma facção dissidente da Igreja Adventista do Sétimo Dia que acreditava que o mundo iria acabar em 2015 e havia encorajado os fiéis a abandonar as respectivas vidas e a retirar-se para um campo isolado”, recorda a HRW.

O governo negou que tenham morrido dezenas (muito menos centenas) de pessoas, como sustentam grupos de oposição e activistas nacionais e internacionais, mas recusou o pedido de acesso ao local dos acontecimentos feito também pelo Alto Comissariados da ONU para os Direitos Humanos “para a abertura de uma investigação independente”.

Após o incidente, as forças de segurança angolanas isolaram a área, “declarando-a zona militar”.

“Os activistas dizem que os soldados enterraram um elevado número de cadáveres em valas comuns e vários familiares de membros da seita declararam que ainda não foram capazes de enterrar os seus entes queridos. Somente duas semanas após o incidente foi concedido acesso ao local a um pequeno grupo de deputados e jornalistas, a quem foi feita uma visita orquestrada e vigiada de perto”, acrescenta a HRW no seu comunicado.

“O julgamento de Kalupeteka sublinha a necessidade de justiça, tanto para as famílias dos agentes assassinados como para as famílias dos membros da seita que morreram. O julgamento deverá apresentar as investigações internas do próprio governo sobre os acontecimentos que, de uma forma ou outra, deveriam ser tornadas públicas pelo governo”, defende a HRW.

A ONG britânica questiona, em conclusão, que se “afinal nada há a esconder, por que razão deverão os relatórios manter-se confidenciais? E por que não permite o governo uma investigação independente ao que aconteceu?”

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